Grão versátil

Por Fleury Tavares   

 

Alimentação animal e humana (grão e farinha), produção de biomassa, álcool, açúcar e até vassouras são algumas das suas utilidades. O sorgo tem como centro de origem a África e parte da Ásia.

Apesar de ser uma cultura muito antiga, somente a partir do século dezenove é que teve um grande desenvolvimento em muitas regiões agrícolas do mundo.

Acompanhe a entrevista com o pesquisador José Avelino Santos Rodrigues, o”Pio” como é mais conhecido (abaixo),  com especialidade em Melhoramento Genético de Plantas da Embrapa Milho e Sorgo, Sete Lagoas/MG, que falou sobre a versatilidade do grão.

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DV – Afinal o que é o sorgo? Qual a sua origem?

Pio – O sorgo é uma planta muito parecida com o milho. Quando você vai ao campo, se a pessoa não estiver familiarizada não saberá distinguir se é milho ou sorgo.

Mas o sorgo tem características bem diferenciadas do milho.sorgo (Sorghum bicolor L.) é o quinto cereal mais plantado do mundo, superado apenas pelo arroz, seguido do milho, o trigo e a aveia que são os quatro mais cultivados no mundo – embora haja anos em que o milho e o arroz trocam de posição.

É cultivado em áreas e situações ambientais muito secas e muito quentes, já que suporta um elevado grau de estresse híbrido, com alta produtividade,  salienta o especialista.

Segundo Pio, é uma planta originária da África, bem mais resistente à seca do que o milho, com inúmeras utilidades. “Nós costumamos falar que tudo se faz com o milho dá para fazer com o sorgo; bolo de farinha, tabule etc., dentre outras aplicações”.

Ele explica que nos continentes africano e asiático 80% do sorgo plantada é utilizado na alimentação humana e 20% na dos animais. Já na América do Norte e Sul, acima de 90% é direcionado à nutrição animal (bovinos de corte, leite, aves e suínos) para produzir carne, leite e ovos, seja na forma de grão ou forragem.

DV – Quando o sorgo veio para o Brasil e como foi a sua adaptação?

Pio – Conta a história que o o sorgo chegou ao Brasil trazido pelos escravos pelos idos de 1600. Só que ficou aqui latente, plantado aqui e ali.

Comercialmente a cultura do sorgo começou mesmo a partir de 1960 plantado para produção de grão e silagem na agricultura comercial a partir da importação de sementes híbridas dos EUA, e da Argentina.

Os primeiros híbridos foram feitos nos Estados Unidos na década de 1950.

Atualmente, a cultura do sorgo é totalmente mecanizada do plantio à colheita, seja para forragem ou para grão. A empresa Agroceres que foi pioneira no Brasil para comercializar o primeiro milho híbrido, também foi o do primeiro sorgo. A primeira semente híbrida de sorgo da Embrapa surgiu em 1974. BR 300.

DV – O objetivo inicial do uso do grão no Brasil era a nutrição animal?

Pio – O primeiro foi  o sorgo forrageiro  destinado à nutrição animal, depois é que veio o sorgo granífero para fazer grão, ração, concentrados, produção de amido, óleo combustível, alimentação humana, dentre outros usos. Tanto que até hoje os dois materiais que mais dominam são o granífero e o forrageiro.

Mas a cultura sempre foi usado na nutrição de animais (bovinos, suínos e aves) e todos os movimentos para uso alimentação humana não tiveram muito sucesso. Isto porque no Brasil ainda existe muito preconceito para usar sorgo em nossa dieta alimentar.

DV – Quais os tipos de sorgo que existem e suas aplicações práticas?

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Pio – Hoje no Brasil nós temos seis tipos específicos de sorgo: granífero, silageiro, biomassa, sacarino, vassoura e o pastejo.

O granífero que é uma planta de porte baixa (inferior a 1,6 m)  para produzir grãos para alimentação humana ou animal. Mas também produz amido, óleo comestível e industrial, cera etc.

Os outros são os  forrageiros, com alturas superiores a 2 metros que tem suas subdivisões. Um deles é uma cultivar que produz silagem, tem muito grão, oferece boa digestibilidade para fornecer nutrição aos animais e também uma boa produtividade.

 Temos o sorgo forrageiro biomassa (*)  que produz energia (que chamamos de energia de segunda geração). Ou seja, você vai queimar para produzir calor, ou pode moer passando por um tratamento enzimático e o processamento químico produz álcool de segunda geração.

Já o sacarino é aquele que, depois de moído, produz álcool e açúcar do colmo da planta (onde há água e açúcar), num processo semelhante ao da cana de açúcar.

Outra cultivar forrageiro vassoura é uma planta com pequena porcentagem de grãos e panículas (**) para produzir vassouras, sendo muito utilizado na agricultura familiar.

Há também o sorgo de pastejo, que é um cruzamento de duas espécies – Sorghum bicolor e Sorghum sudanense, que em torno de 30/35 dias a cultura está pronta para os animais pastejarem.

DV –  E o  fator tanino no sorgo, qual a diferença na alimentação animal e humana?

Pio – O tanino embora não seja tóxico aos animais, influencia no desempenho deles. Ou seja, os sorgos que têm tanino vão diminuir a digestibilidade da proteína, o que reduz o desempenho do animal.

Trocando em miúdos, por exemplo, aquele frango de granja  que a gente compra no supermercado – do pintinho até o crescimento é abatido com 40 dias para produzir carne.

Caso o animal seja alimentado com uma ração a base de sorgo que contenha tanino,  o animal vai ser abatido com 48/50/52 dias de idade, diminuindo seu desempenho, ou seja, vai demorar a chegar no peso desejado.  O pintinho até virar frango de corte com esta demora mais tempo para engordar e isto é prejuízo para o granjeiro.

O mesmo raciocínio vale para o suíno. Geralmente o animal é abatido com 70 dias, agora ser for alimentado com ração de sorgo com tanino, vai ser abatido com 90/95 dias o que resultará em prejuízo para o criador.

Já no caso dos bovinos, eles podem receber ração de sorgo com tanino ou sem tanino que a vaca ou o boi vão comer,  produzir leite e carne do mesmo jeito. O tanino não interfere na digestão dos bovinos, porque têm quatro estômagos, enquanto que suínos e aves são monogástricos.

Mas voltando a alimentação humana, segundo o que as pesquisas científicas vem demonstrando, o tanino é muito bom, porque estamos trabalhando para combater a obesidade. Hoje em dia, as pessoas não podem engordar muito devido aos problemas de saúde com alimentação.

Então no caso dos humanos, o tanino  age para diminuir a digestibilidade. Resumindo: a pessoa come, fica saciada, mas não engorda porque o tanino vai reduzir a ingestão de calorias.

DV – Quais as regiões do Brasil onde o sorgo é plantado

Pio – Hoje 88% da sorgo granífero é plantado no Centro-Oeste e Sudeste e os 12% no restante do País. Os cinco maiores produtores de sorgo são Goiás, Minas Gerais,  Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e São Paulo.

 


 

SORGO NA AGRICULTURA BRASILEIRA

No Brasil, a área cultivada de sorgo granífero na safra 2014/2015 ocupou 722 mil hectares, com produção de 2,06 milhões de toneladas de grãos. A produtividade média nacional está em torno de 2,8 mil kg/ha, na safrinha, período de semeadura em fevereiro/março, após a colheita da soja.

As regiões Centro-Oeste e Sudeste respondem por mais de 88% da produção nacional de sorgo, mesmo assim as regiões Sul e Nordeste também têm mostrado investimentos em pesquisa e divulgação da cultura.

Goiás é o principal estado produtor, com 41% da produção nacional, seguido por Minas Gerais (29%) e Mato Grosso (14%), de acordo com dados da Conab, em 2015. Veja na Figura 1 os principais estados produtores de sorgo granífero no Brasil, safras 2010 a 2012.

Segundo o pesquisador Cícero Beserra de Menezes, do Núcleo de Recursos Genéticos e Cultivares da Embrapa Milho e Sorgo, essa produtividade pode ser aumentada, se o agricultor seguir as recomendações técnicas de manejo, entre elas plantar na data certa, escolher bem a cultivar, usar adubos e defensivos.

“Muitos produtores tecnificados colhem cinco toneladas por hectare, na safrinha. Além disso, se o sorgo for plantado no período entre outubro e novembro, a produção pode ser de até dez toneladas por hectare”, afirma Menezes.

 

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Figura 1. Principais estados produtores de sorgo granífero no Brasil. Safras 2010 a 2012. Fonte: Conab, 2013.

 

Sorgo granífero: produção ainda é modesta mas pode crescer com o  aumento do consumo da farinha como alimento funcional humano

No que se refere ao mercado de sorgo granífero, no País, os números são bem mais modestos, na safra 2014/2015, foram produzidos 2,055 milhões de toneladas (Conab).

“Na África, o sorgo granífero é um componente importante da dieta alimentar humana, mas de forma geral o cereal é mais utilizado para alimentação animal ao redor do globo. No Brasil, o sorgo é utilizado quase exclusivamente para alimentação animal”, afirma o economista Rubens Augusto de Miranda, pesquisador da Embrapa Milho e Sorgo.

Por outro lado, a demanda para a produção de alimentos com sorgo para consumo humano, no Brasil, está apenas começando.

“Porém, o mercado já conta com o apoio técnico das pesquisas realizadas pela Embrapa e seus parceiros e com empresas privadas que já investiram neste segmento de produção de alimentos funcionais com o sorgo”, explica o analista Marcelo Dressler, da Embrapa Produtos e Mercado – Escritório de Negócios Sete Lagoas/MG.

Segundo Dressler, a oferta de grãos de sorgo beneficiados para a indústria alimentícia tende a crescer, bem como a oferta de farinha de sorgo.

Para ele, a farinha de sorgo é uma interessante opção no mercado de alimentos funcionais, que beneficiam a saúde. Existe potencial de crescimento do seu mercado, com capacidade produtiva para atender a demanda e expectativa de valores acessíveis aos consumidores.

“Assim, a oferta e o consumo tendem a aumentar à medida em que houver mais divulgação dos produtos , tornando-os conhecidos e apreciados”, estima o especialista.

Mais informações: Embrapa

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(*)Biomassa é a matéria orgânica, que pode ser utilizada na produção de energia. Nem toda a produção primária do planeta passa a incrementar a biomassa vegetal, pois parte dessa energia acumulada é empregada pelo ecossistema na sua própria manutenção. As vantagens do uso da biomassa na produção de energia são o baixo custo, o fato de ser renovável, permitir o reaproveitamento de resíduos e ser bem menos poluente que outras fontes de energia como o petróleo ou o carvão.
Os tipos de biomassa mais utilizados são: a lenha (já representou 40% da produção energética primária no Brasil), o bagaço da cana-de-açúcar, galhos e folhas de árvores, papéis, papelão, etc. A biomassa também é o elemento principal de diversos novos tipos de combustíveis e fontes de energia como o bio-óleo, o biogás, o BTL e o biodiesel. (http://www.lippel.com.br/br/sustentabilidade/o-que-e-biomassa#.V092PZErKUl)
(**)Inflorescência, em cacho ou em espiga, ou seja as flores aparecem geralmente apenas nas ramificações e no topo da raque.