Desde 2015, a Ferrari Stella Comunicação Integrada edita o Catálogo Nacional de Produtos Orgânicos, Naturais e Sustentáveis das feiras Bio Brazil/Naturaltech, guia oficial do evento direcionado ao varejo de alimentos que comercializa produtos orgânicos e naturais.
Durante a 14ª edição da Bio Brazil Fair (2018) a agência, a exemplo de anos anteriores, também expôs em seu estande kits promocionais e displays sustentáveis de madeira certificada para os pontos de venda dos pequenos e médios varejistas.
Diário Verde conversou com o publicitário e consultor de varejo Miguel Ferrari, sobre a atuação de sua agência e a expansão do mercado brasileiro de alimentos e produtos orgânicos e naturais, mesmo com as dificuldades, gargalos e desafios.
Confira abaixo, os principais trechos da entrevista.
DV – Quem é e o que faz a Ferrari Stella? Por que resolveu atuar no mercado de alimentos saudáveis?
Miguel Ferrari – É uma agência de comunicação e marketing com 30 anos de existência e que em 2000 entrou no mercado de produtos orgânicos e naturais, segmento que fiquei apaixonado ao conhecer.
Nessa época a FS coordenava a área de comunicação e marketing da Abras (Associação Brasileira de Supermercados), quando nasceu o primeiro Espaço Orgânico Natural & Sustentável.
Em 2005 foi criada a primeira Semana de Alimentação Orgânica em Supermercado, quando a Marina Silva era a ministra do Meio Ambiente e o presidente da entidade era o João Carlos de Oliveira. E foi assim, por meio desta parceria, que criamos e desenvolvemos a Semana de Alimentação Orgânica.
Na realidade, a Ferrari Stella Comunicação é uma agência de trade marketing , conceito que vai além da mão-de-obra, do merchandising, a inteligência do trade precisa saber os objetivos comerciais da empresa e do marketing para atuar.
Aí ela pode ou não fazer uma ação no ponto de venda com uma promotora, lançar um produto. Resumindo: a área de trade marketing vai muito além da mão de obra operacional e hoje o nosso principal foco é o segmento saudável.
A agência edita o catálogo oficial da Bio Brazil, produz kits promocionais e displays sustentáveis focando no varejo de orgânicos e naturais.
DV – Quais os produtos e serviços que a agência oferece ao mercado de produtos orgânicos, naturais e sustentáveis?
Miguel Ferrari – A Ferrari Stella Comunicação Integrada edita o Catálogo Nacional de Produtos Orgânicos, Naturais e Sustentáveis das feiras Bio Brazil/Naturaltech. Desde 2015 é o guia oficial da mostra com uma tiragem que vai para o varejo alimentar – supermercados, lojas especializadas, panificação, restaurantes – enfim, todo o comércio que vende produtos orgânicos e naturais.
As empresas anunciantes na publicação demonstram que os orgânicos vão muito além das frutas, legumes e verduras e o nosso anuário oferece a possibilidade ao varejista ter um leque com uma centena de produtos que ele possa vender na sua loja.
A nossa agência atendeu durante muito tempo a grandes empresas convencionais como a Nestlé, Grandene, Unilever, Refinações Milho Brasil, dentre outras.
Ao longo do nosso trabalho constatamos que as empresas de orgânicos não possuem uma verba específica para ações de marketing, então desenvolvemos estratégias e ferramentas para a indústria girar seus produtos nos pontos de venda.
De que adianta o empresário ter um produto ecológico e poluir o ambiente na hora de divulgar?
A primeira iniciativa dessa natureza foi organizarmos ilhas temáticas em feiras do setor varejista, inclusive, neste caso, fomos pioneiros ao montar o primeiro empreendimento no país em 2005, em evento da Associação Brasileira de Supermercados (Abras).
Depois montamos uma área de dois mil m² para a Associação Paranaense de Supermercados (Apras) e posteriormente outro espaço de 30 m² compartilhado na feira da Associação Paulista de Supermercados (Apas).
Compra de espaços nas feiras, venda de display ecológico e kit promocional
Atualmente, a nossa estratégia é a compra de espaços de 250 a 300 m² nas feiras, fracionamos e levamos produtores para vender para supermercados, hotéis, restaurantes, padarias, viabilizando e encurtando o caminho para que eles cheguem ao varejo.
Além dessas ferramentas, desenvolvemos um display 100% ecológico e sustentável de madeira pinus de madeira certificada, material reaproveitado do que as madeireiras descartam, cujo objetivo é incentivar e girar o produto orgânico no ponto de venda.
Cross merchadising
Outro instrumento para estimular a comercialização é um kit de campanha promocional a um custo de R$ 100/150 composto de cartaz, marcador de preço, gôndola e a linha de cross merchadising (venda por associação de produtos correlatos, mel com bolacha ou um queijo ralado junto com macarrão, por exemplo) feita em papelão.
Sempre faço questão de destacar a todo produtor, que não adianta ter um alimento orgânico, com selo auditado por certificadora e ter uma embalagem que demora 10 mil anos para se decompor, uma fita de cross merchadising e um display de PVC. De que adianta o empresário ter um produto ecológico e poluir o ambiente na hora de divulgar?
O orgânico veio pra ficar, não é mais nicho de mercado porque o consumidor busca uma alimentação saudável
DV – Como analisa o crescimento do mercado de orgânicos, naturais e saudáveis no Brasil? É somente um nicho de mercado? Os números de expansão que são divulgados na mídia são reais?
Miguel Ferrari – Hoje o orgânico veio para ficar e deixou de ser uma tendência ou um nicho de mercado, isto porque o consumidor está em busca realmente de uma alimentação saudável. Segundo dados da Associação Brasileira de Supermercados, 98% das residências consomem um produto saudável. (Pesquisa da Fiesp – Federação das Indústrias do Estado de São Paulo – divulgada em 2018 revela que 80% dos brasileiros buscam alimentação saudável).
O que não existe nesse mercado é pesquisa. Quando a gente fala em crescimento, existem muitos dados que são divulgados que o mercado cresceu 20% ou 25% sem base estatística.
O que de fato cresceu? O número de agricultores orgânicos? As vendas para o varejo que, por sua vez, também está comercializando mais? Então, simplesmente divulgar números sem nenhuma base científica acaba confundindo o mercado.
Não vou te precisar quanto cresceu a venda de produtos orgânicos porque não existe este número.
Só porque é um produto orgânico não pode custar cinco vezes mais do que um convencional
DV – E a velha questão dos preços dos orgânicos ainda considerados muito caros pelo consumidor e que também não são acessíveis para as pessoas com menor poder aquisitivo?
Miguel Ferrari – Novamente são informações desencontradas que jogam no mercado. As empresas posicionam os produtos orgânicos para venda à classe A, e isto está errado, porque ela não sabe bem o que são.
A sua compra é determinada com os olhos para um belo pé de alface ou um tomate. E sabe-se que a apresentação visual de um alimento orgânico nem sempre pode ser comparado a de um produto convencional.
Visões diferentes
O consumidor de alto poder aquisitivo visualiza o alimento como fatura e enxerga o orgânico como um produto sem qualidade. O público da classe A não é o consumidor de orgânicos, mas sim o da classe C que é um pouco mais esclarecido.
Ele pode não ter condições de comprar habitualmente na sua casa, mas sabe o valor e a qualidade do orgânico e principalmente a importância para a sua saúde.
Não considero uma opinião controversa, porque você pode reparar que os consumidores de orgânicos são pessoas com um nível cultural e de conhecimento maior o que independe da classe social.
Uma pessoa pode ter dinheiro, mas não tem cultura. Por exemplo: em uma das lojas no mercado de orgânicos de Curitiba/PR, o maior comprador de alimentos é uma dona de casa doméstica, que prefere adquirir produtos saudáveis para o filho dela e evitar levá-lo ao SUS (Sistema Único de Saúde).
Ela acredita que, se fornecer uma boa alimentação ao filho, não precisa recorrer à medicina. Trata-se da consciência instintiva de uma pessoa mais simples.
O anuário de 2018 publicou uma pesquisa sobre comportamento do consumidor que fala exatamente isso, ou seja, quem mais consome alimento saudável é a classe C e não a classe A.
Ou seja, um pé de alface sempre vai ser um pé de alface e não pode custar um preço exagerado
DV – Como você analisa os gargalos da cadeia produtiva dos orgânicos do campo até o consumidor?
Miguel Ferrari – Existem distorções no mercado sobre números e informações sem base. O setor varejista acredita que o orgânico é uma marca Premium, aquela considerada apenas quando acreditamos que ela vale o preço adicional que por ela se cobra, pois isso indica que estamos dispostos a pagar um excedente por produtos que possuem aquele “algo a mais” que os fazem únicos.
Uma marca Premium é construída sobre atributos específicos, tangíveis e intangíveis, que lhe dão um senso de valor, o que permite uma margem maior.
Só que o orgânico não é uma marca Premium, e sim um produto 100% puro, auditado pelo Mapa (Ministério da Agricultura) e pelas empresas certificadoras, mas isto não permite se cobrar 3 a 5 vezes mais caro do que um alimento convencional.
Existe um aspecto que tanto a indústria como o comércio desconhecem que é o ‘valor percebido’ pelo produto. Um exemplo: um mel convencional custa ‘X’, então um mel orgânico não pode custar cinco vezes mais ‘X’, porque mel é mel e um pé de alface é um pé de alface.
E aí vem aquele argumento de que a produção é pequena, me lembra aquele slogan do biscoito Tostines (*Fresquinho porque vende mais? Vende mais porque é fresquinho? ), então podemos parafrasear ‘a produção é pequena porque não vende, ou não vende porque a produção é pequena’?
Neste sentido, tanto a indústria como o varejo colocam margens muito maiores no preço do orgânico. Acontece que este produto não é grife, mas, sim, um alimento com certificação de pureza.
Mercado de orgânicos tem distorções. O varejista que precifica com margens maiores porque acredita que é um produto para a classe A
Já o agricultor que vende diretamente ao consumidor, acaba cobrando o mesmo valor que uma grande rede de supermercado
DV – E quando o consumidor vai a uma feira orgânica – em que não há intermediação do grande varejista – os preços dos produtos também são relativamente caros. Teoricamente, não deveriam custar mais barato?
Miguel Ferrari – Em minha opinião o agricultor não sabe calcular preço. E precificação é uma coisa muito séria. O que acontece é que o produtor pesquisa na loja para checar por quanto o alimento está sendo vendido na gôndola do supermercado e aí vende para o consumidor pelo mesmo preço.
Só que o produtor esquece que uma rede de supermercado possui uma série de custos fixos como o armazenamento, logística, reposição de mercadoria, promotor de venda, caixa, água, luz que são calculados sobre o valor final do produto. E ele não pode cobrar o mesmo preço do que o de uma grande rede de supermercado.
Como mencionei anteriormente, são distorções que existem no mercado de orgânicos. De um lado, o varejista que está colocando um preço com margens maiores porque acredita que é uma mercadoria para a classe A e do outro o agricultor que vende diretamente ao consumidor e também segue o mesmo caminho, inviabilizando economicamente o produto para o consumidor final.
Acredito que é lindo a ‘filosofia da vida saudável’, mas nós temos que ter condições financeiras para comprar esse produto. Até porque, um pé de alface sempre vai ser um pé de alface, aqui ou em qualquer lugar, e que custe 30% a 40% mais caro do que o produto convencional, perfeito. Agora custar 3 a 5 vezes mais caro do que um alimento não orgânico está errado.
DV – Qual a sua opinião sobre mudança de local da Bio Brazil Fair do Pavilhão da Bienal do Ibirapuera para o Parque de Convenções do Anhembi?
Miguel Ferrari – Achei fantástica a mudança, sempre falei com a direção da Francal Feiras (organizadora da mostra) que a Bienal não tinha mais condições para abrigar grandes eventos, até porque foi criada nos anos 1940 para exposições de arte e receber um público bem menor.
Além do fato de que as duas feiras, a Bio Brazil e a Naturaltech, cresceram muito e o Anhembi é um local muito melhor, agradável e confortável para o expositor e os visitantes.
Mais informações: Espaço Orgânico & Sustentável