Lavouras de café, cana-de-açúcar, milho, feijão, hortaliças e frutas já apresentam redução na produção em relação à safra passada. Colheita de soja também deve ser menor do que o esperado.
A crise hídrica que atinge a região Sudeste do país começa a afetar a produção agrícola no Brasil. Algumas culturas já tiveram redução na safra passada, e a estimativa para a produção de algumas commodities também é negativa. O impacto da estiagem na agricultura deve ser sentido principalmente pelo consumidor, com aumento de preços.
Perdas são esperadas nas safras de café, cana-de-açúcar, milho e feijão. A produção de soja deve ficar abaixo da estimativa divulgada em janeiro pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Além disso, o desenvolvimento de lavouras de hortaliças e frutas na região Sudeste também ficou comprometido com a escassez de chuva no início do ano.
Em janeiro, a quantidade de chuva ficou abaixo da média em diversas regiões do país, principalmente no Sudeste, Centro Oeste e Nordeste. Em fevereiro, março e abril, as chuvas devem também ficar abaixo da média na região Sul e em partes das regiões Sudeste, Centro-Oeste e norte da região Nordeste.
“As culturas de verão, como milho e soja, devem sofrer as maiores perdas na safra, pois entre janeiro e fevereiro é o período que a planta requer maior quantidade de água, e a ocorrência de estresse hídrico pode acelerar a senescência foliar, encurtar o período de enchimento das sementes, resultando em baixos rendimentos”, afirma a meteorologista Danielle Ferreira, do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet).
E o problema pode deixar marcas de longo prazo. “Se a seca persistir, poderá haver problemas sérios para a próxima safra, sem dúvidas”, reforça o engenheiro agrônomo da Embrapa Semiárido Luís Henrique Bassoi acredita que a estiagem prolongada poderá prejudicar o abastecimento de alimentos no país.
Irrigação comprometida
O provável racionamento de água em São Paulo deve afetar principalmente a produção de hortaliças e frutas, culturas que dependem da irrigação. “Os reservatórios em todo o país estão com sua capacidade de armazenamento com valores baixos, muito preocupantes, e que comprometem a geração de energia e a irrigação”, afirma Bassoi.
Até o momento, o café foi a cultura que mais sofreu com a crise hídrica. A safra de 2014, com 45,3 milhões de sacas, foi 7,7% inferior à de 2013, quando foram colhidas 49,15 milhões de sacas.
A estimativa no primeiro balanço para 2015, feito pela Conab, é de que a produção permaneça estável. Dependendo das condições climáticas, pode haver tanto uma queda de 2,7% como um aumento de 2,8% – com a escassez de chuvas e as altas temperaturas dos últimos meses, porém, a tendência é negativa.
O maior impacto da estiagem deve ser sentido no bolso do consumidor. A queda na produção deve manter elevado o preço do café no mercado doméstico e também no internacional. O Brasil é o maior produtor e exportador de café do mundo, responsável por 33,73% da produção mundial. Minas Gerais, um dos estados mais atingidos pela estiagem, é por sua vez o maior produtor de café do país, responsável por mais de 50% da produção nacional.
Açúcar fica salgado
Além do café, a cana-de-açúcar também sofre com a seca. A safra 2014/2015 é estimada em 642,1 milhões de toneladas, com uma queda de 2,5% em relação ao volume colhido na safra passada, de 658,8 milhões de toneladas. A Conab reforça que a queda só não será maior devido ao aumento de 2,2% na área plantada no país.
Essa diminuição está relacionada principalmente à falta de chuvas. Em São Paulo, estado responsável por cerca de 50% da produção total de cana no país, a redução no rendimento agrícola pode chegar a 10,5%.
“É uma etapa na qual a cana deveria estar crescendo vegetativamente e ela está ficando mais fina, não chega a engrossar, o que gera uma redução na produção de açúcar e etanol”, afirma Fernando Pimentel, sócio-diretor da consultoria Agrosecurity.
O Brasil é responsável por mais da metade do açúcar comercializado no mundo e deve reduzir cerca de 4% sua produção, estimada em 36 milhões de toneladas.
Grãos incertos
A safra de milho de verão também deve apresentar uma queda. Estima-se uma redução de 6,4% em relação à passada, ficando em torno de 29,64 milhões de toneladas. O feijão deve ter também uma redução de 2,7% na produção, caindo de 3,43 milhões de toneladas para 3,38 milhões de toneladas.
A seca do final e início de ano reduziu também as estimativas de produção da soja, que é a líder nas exportações brasileiras, responsável por 18,3% desse volume nos primeiros seis meses de 2014. A produção da commodity deve crescer no país, mas ficará abaixo do previsto.
Em janeiro, a Conab previu uma colheita de aproximadamente 95 milhões de toneladas de soja. No entanto, ela está sendo menor do que a estimada em lavouras de Goiás, Mato Grosso, Bahia, Minas Gerais, Piauí, Paraná e São Paulo.
Para o técnico da Conab Olavo de Sousa, ainda é cedo para medir o impacto dessa redução nas exportações, pois há muito estoque de culturas. “Com o câmbio ajudando não tem como dizer que a exportação será menor”.
Para Pimentel, a queda dos preços no mercado internacional é o que deve pesar na balança comercial, e não a redução na produção. “O impacto tem sido maior nos preços internacionais da soja e do milho. Nos últimos 30 dias, por exemplo, o preço da soja caiu 17%, enquanto a perda na safra brasileira não passa de 5%. Uma combinação de preço e queda na safra pode chegar a 20% de redução no valor de exportação em dólar”, prevê.
Já a redução na produção e no estoque de culturas deve inflacionar o preço dos alimentos nas prateleiras dos mercados brasileiros
Fonte: DW